A(s) Verdadeira(s) Estória(s)

de Adão e Eva

 

 

 

UM GRANDIOSO ÉPICO DE PROPORÇÕES BÍBLICAS  

 

(Versão 1.01)

 

 

 

- Guião -

 

Francisco Suarez

 

  

 

 

 

 

Parte I        Parte II        Parte III        Parte IV        Parte V        Parte VI

 

 

 

 

Nota do autor: Este skech foi concebido para funcionar em pleno em 6 partes, que aqui incluí, com uma duração máxima aproximada de 45 minutos (dependendo do ênfase que se pretenda dar a cada uma das cenas), podendo no entanto funcionar encenando apenas a Parte I, ou as Partes I e II, desde que haja uns pequenos ajustes no texto. Parte da situação aqui criada pode também ser encenada com o recurso a outras personagens, sem a necessidade do Herman José, mas obviamente que boa parte do texto baseia-se na imensa capacidade e versatilidade dele para funcionar convenientemente (nomeadamente e sobretudo as Partes II e III). Para evitar “censura” ou  possíveis reacções negativas pode-se também retirar referência a pedofília e outros assuntos sensíveis, mas na minha opinião perder-se-iam também muitos dos momentos altos do sketch. Para a sua realização, o sketch necessita de um trabalho de montagem de várias cenas gravadas previamente, para fazer todas as justaposições necessárias de todos os personagens, de que falarei em pormenor na Parte III.

 

 

Índice:

 

Parte I        -      O Prof Herman José Saraiva apresenta Adão e Eva

 

Parte II       -      O Diácono Remédios apresenta Adão e Eva

 

Parte III      -      O Caos controlado

 

Parte IV      -      Adão e Eva deixam o Paraíso

 

Parte V       -      O Prof Herman José Saraiva apresenta Abel e Caim

 

Parte VI      -      O Diácono Remédios apresenta Abel e Caim

 

 

 

Personagens (das Partes I e II):

 

-                  Adão (Herman José)

 

-                  Prof. Herman José Saraiva (Herman José)

 

-                  Diácono Remédios (Herman José)

 

-                  Eva (Maria Rueff?)

 

-                  Serpente Verde (Ana Bola)

 

-                  Serpente Vermelha (Ana Bola)

 

-                  Narrador/Repórter (Cândido Mota)

 

 

 

 

Parte I

 

   

 

Fade-in.

 

Ecrã negro, com música de fundo de cariz épico, onde surgem várias frases, que o narrador se encarrega de ler, por entre rufar de tambores.

 

HERMAN SIC

 

Narrador:

O Herman SIC orgulha-se de apresentar, em rigoroso exclusivo mundial...

 

A(S) VERDADEIRA(S) ESTÓRIA(S) DE ADÃO E EVA

 

Narrador:

...A estória verdadeira, escondida desde o início dos tempos, e até à mais anos do que leva o Benfica sem ganhar o Campeonato Nacional de Futebol. Finalmente a verdade é trazida á Luz,... (pequena pausa) ...ao contrário da Taça, que desde o século passado não entra nesse mesmo Estádio. (esta frase é dita num volume mais baixo e de um modo mais apressado)

 

Narrador:

...Com a participação especial...

 

Prof. HERMAN JOSÉ SARAIVA

 

Narrador:

 do nosso grande estoriador Prof. Herman José Saraiva, com a sua visão límpida e esclarecedora destes acontecimentos fulcrais para a Estória da Humanidade.

 

 

Pausa de 2 a 3 segundos, seguida do aparecimento da primeira imagem do sketck.

Aparece o Prof. Herman José Saraiva na sua pose habitual, gesticulando e com todos os outros seus tiques.

 

Prof. Herman:

Senhores telespectadores, muito bem vindos. Hoje vamos debruçar-nos sobre a mais antiga estória do mundo. A estória de Adão e Eva, do Pecado Original, e em como a versão que chegou até nós é na verdade bastante deturpada e diferente do que realmente aconteceu. Vamos ver.

 

Prof. Passa a narrar em voz off, ou em alternativa faz a introdução descrevendo a situação, e depois retira-se suavemente para se assistir ao desenrolar da história. Por detrás dele vê-se uma floresta: o Paraíso (como em outros sketchs, background poderá ser em desenhos básicos e simples).

 

Prof. Herman:

Quando Deus criou o Mundo, e como uma coisa destas dá o seu trabalho, e até Ele tem direito a uma certa diversão, ao sexto dia resolveu criar o Homem, para se entreter um bocadinho com as parvoíces todas que ele ia fazer. Claro que nem Deus imaginava quão estúpidos nós nos tornaríamos e como parecemos ter como único objectivo: destruirmos o que Ele fez. Mas isso meus amigos, já é outra história.

O que nos interessa hoje é a história de Adão e Eva.

 

Termina ele esta frase e vê-se Adão a andar sozinho e cabisbaixo no Paraíso com um ar muito malandro, a dar pontapés em pedras e/ou plantas, etc. Veste umas peles de animal, género Homem das Cavernas.

Adão passa vagarosamente na imagem, da esquerda para a direita, desaparecendo do enquadramento.

 

Prof. Herman:

Como Adão andava muito sozinho, Deus resolveu criar a Mulher, para os dois fazerem companhia um ao outro. Para isso tirou uma costela ao Adão...

 

Quando Adão sai do enquadramento da camara, ouve-se Adão gritar de dor com a remoção da costela.

 

Prof. Herman:

...foi a primeira de muitas dores que as mulheres iriam criar em nós, pobres homens.

 

Vê-se Adão regressar ao enquadramento agarrado ás costelas, mas pouco depois esquece-se da dor quando vê Eva, que entretanto aparece do lado contrário da imagem, e rapidamente se envolvem em brincadeiras (com Adão em breve a ser um bocado bruto, deixando o espectador antever a sua personalidade). Eva veste também umas peles (talvez em duas peças).

 

Prof. Herman:

E assim foi durante muito tempo, com Adão e Eva a brincarem alegremente no Paraíso. Mas foi então que Adão se apercebeu de um defeito de fabrico da Eva,... e que infelizmente ainda hoje se faz sentir em todas as mulheres:... elas nunca se calam!! Falam incessantemente!! Ora meus amigos,... a boca das mulheres traz-nos muitas coisas boas, mas era bom que não fosse usada para nos torturar constantemente os ouvidos. Infelizmente só mais tarde é que foi inventado o fecho eclair,... mas aí já era tarde, meus amigos!

 

Durante estas últimas frases assiste-se a uma progressiva e cada vez maior perseguição de Eva a Adão, e este corre e tenta em desespero, mas em vão, tapar os ouvidos, e esconder-se para descansar um pouco. Adão acaba por se conseguir esconder.

 

Prof. Herman:

Ora foi justamente num destes “retiros estratégicos” para os ouvidos, que Adão conheceu uma serpente, que estava a descansar numa macieira. E foi esta inocente conversa que ditaria a sua expulsão do Paraíso.

 

Chega-se agora ao enquadramento em que decorrerá todo o resto da acção.

Adão à esquerda (a esconder-se), seguido da macieira, com grande e proeminente maçã, com uma Serpente Verde junto à árvore, e Eva em segundo plano, no extremo direito da imagem, a uns 10 metros, brincando e mais tarde fazendo poses provocatórias (inconscientemente ou não)

A Serpente Verde tem um ar apatetado, e não especialmente inteligente.

Adão olha para Eva com olhar libidinoso, enquanto Serpente julga que ele está a olhar para a maçã.

 

Serpente Verde:

Estás a vê-la? Bonita, não é? Está mesmo madura! Dá mesmo vontade de trincar. Deve ser bem apetitosa.

 

Adão:

Mas não posso... é proibido.

 

Serpente Verde:

Claro que podes. Ninguém vai notar. E está-se mesmo a ver que tu a queres.

 

Adão:

Está? Ups!!...

 

Adão pôe as mãos (ou folhas?) á frente da tanga, tentando disfarçar.

 

Serpente Verde:

Vá lá. Que esperas? Pega nela e acaba de uma vez com essa indecisão. Um homem tem as suas necessidades. Tem que comer!!! Se não comes morres!

 

Adão:

Morro? Mas ninguém me tinha dito nada!!??

 

Serpente Verde:

Tás a ver?! Tu não sabes nada! Ainda és mais estúpido do que pareces. Acredita no que eu te digo. Primeiro começas por te sentir fraco, uma fraqueza nas pernas...

 

Adão:

Hum, realmente sinto por aqui uma sensação esquisita. (faz um gesto meio esclarecedor)

 

Serpente Verde:

... depois podes começar a sentir umas dores de cabeça..

 

Adão:

Aqui? (aponta para os 2 lados da testa com um gesto, inocentemente insinuando uns chifres)

 

Serpente Verde:

Não. com isso não te preocupes que só vocês dois é que estão aqui. Mas descansa que depois não te vão faltar dores dessas!! (ri-se com ar estúpido)

 

Adão:

Ahh??! Mas por acaso ando aqui com dores há algum tempo... desde que bati com a cabeça numa árvore... (diz baixinho)

 

Serpente Verde:

É o que eu te digo. Não a comas não!!! Depois não te venhas queixar que te doí o estômago também!

 

Adão:

Mas se dizes que é assim tão bom, porque é que não a comeste tu já? (Adão fica desconfiado)

 

Serpente Verde:

Já olhaste para mim? Isto não é material para o meu bico!! Prefiro uns belos ratinhos bem tenrinhos!!

 

Adão:

Ai tu és desses? Quem olhar para ti nem desconfia de nada!!! (diz ele com ar sabido)

 

Serpente Verde:

Mas pensavas que eu era vegetariano, ou quê?

 

Adão:

Vege... quê?

 

Serpente Verde:

Vegetarian... não interessa!

Olha, tenho mais que fazer. Tou a ficar com fome. Vou procurar os tais ratitos...

 

Adão:

Está à vontade! Eu não vou dizer nada, pá! Não é nada comigo.

 

Serpente Verde:

Ahh?! (confusa)... acho que essa tua fome já te está a toldar as ideias!!!

Faz o que te digo. Pega nela, leva-a para trás daqueles arbustos e come-a duma vez, que ninguém vê!! E se estás assim com tantos problemas com isso, eu nem olho!!!

 

Adão decide-se finalmente, vai até junto da Eva, pega nela (talvez a ponha ao ombro), e leva-a para trás dos arbustos, onde logo a seguir se vêm pedaços de roupa a voar seguidos de uns gemidos estranhos.

A Serpente resolve então abrir os olhos e repara que a maçã ainda ali está na árvore.

 

Serpente Verde:

Mas... (Fica muita confusa e sem perceber nada)

Este Adão é mesmo burro, uma maçã tão apetitosa e ele nem tem coragem para a comer. Agora doí-lhe o estômago, claro. Eu avisei, não comes, agora gemes.

 

Aparece de novo o Prof. Herman na imagem. Enquanto ele faz a sua conclusão continuam a ouvir-se as “dores de estômago” do Adão, agora acompanhado sonoramente pela Eva

 

Prof. Herman:

E foi assim, meus amigos. A História tem destas coisas. A pobre da serpente afinal de contas não teve culpa nenhuma.

 

 

Conclusão provisória.
 
(Continuação na Parte II)

 

 

 

 

 

Parte II

 

   

Prof. Herman está a concluir a sua intervenção quando é violentamente empurrado para fora do enquadramento por uns braços desconhecidos (por enquanto).

Entra com sua habitual "subtileza" o Diácono Remédios (o dono dos braços!).

 

Diácono Remédios:

Meus amigos, tsss... mas o que é isto? Mas que grupo de mentiras vos estão para aqui a contar?

 

Vê-se um braço do Prof. Herman a tentar levantar-se, e o Diácono Remédios dá disfarçadamente um grande pontapé no Prof. Herman, que o deixa KO.

(durante todo este enquadramento sempre que o “narrador” aparece apenas o vemos da cintura para cima, de modo a que se possa fazer esta “troca” de personagens com o mesmo actor – Prof. Herman por Diácono)

 

Diácono Remédios:

Não vos deixeis enganar! Não foi assim que as coisas se passaram. Não havia necessidade. Quereis que vos diga como é que aconteceu realmente, quereis? Eu vou vos contar como foi.

 

Continuamos com o mesmo enquadramento, retrocedendo (o background) até à altura em que Adão se esconde da Eva, junto à macieira.

Adão nesta versão da história é um pobre pateta, nas mãos manipuladoras da Serpente.

 

Diácono Remédios:

Estava Adão a jogar às escondidas com Eva, quando de repente dá de caras com uma maldosa serpente.

 

Surge no enquadramento uma Serpente Vermelha, de aspecto manhoso e diabólico (apenas muda a cor do fato da serpente, que poderá ter uma foice e um martelo visível).

Logo de seguida surge o Diácono na imagem.

 

Diácono Remédios:

E sim, meus amigos, tsss... Era uma serpente com.. comu... com... comu ...ista. cof Cof (engasga-se) Era uma serpente vermelha.

Estes odiosos seres, e não estou a falar só das serpentes, que comem criancinhas ao pequeno almoço.

 

O Diácono retira-se.

A cena da Parte I repete-se, mas com as adaptações que a “verdade” do Diácono requer (sobretudo ao nível da entoação do texto, etc).

 

Serpente Vermelha:

Estás a vê-la? Boa, não é? Está mesmo madura! Dá mesmo vontade de trincar. Deve ser bem apetitosa.

 

Adão:

Mas não posso... é proibido.

 

Serpente Vermelha:

Claro que podes. Ninguém vai notar. E está-se mesmo a ver que tu a queres.

 

Adão:

Não me apetece. Comi há bocadinho.

 

Serpente Vermelha:

Não estou a falar da maçã. Vá lá. Que esperas? Pega nela e acaba de uma vez com essa indecisão. Um homem tem as suas necessidades.

 

Adão:

Não posso.

 

Serpente Vermelha:

Vá lá!! !!! Se não comes, morres! Come-a!

 

Adão:

Morro? Mas ninguém me tinha dito nada!!?

 

Serpente Vermelha:

Tás a ver?! Tu não sabes nada! Ainda és mais estúpido do que pareces. Acredita no que eu te digo. Primeiro começas por te sentir fraco, uma fraqueza nas pernas...

 

Adão:

Hum, realmente sinto por aqui uma sensação esquisita.

 

Serpente Vermelha:

Vá lá!!! Eu não conto a ninguém. Até eu a comia, mas prefiro uns belos ratinhos bem novinhos e tenrinhos!!

 

Adão:

Que horror, como és capaz disso?

 

Serpente Vermelha:

Mas que pensavas que as serpentes vermelhas comiam? Comigo quanto mais novinhos, melhor!

 

Reaparece o Diácono Remédios na imagem, com olhar triunfal e excitado, de quem conseguiu arrancar a maior confissão do mundo a um comunista.

 

Diácono Remédios:

Vêem? Vêem? Que vos tenho dito eu? Eu sempre vos disse que os com... comu.. vermelhos comiam criancinhas ao pequeno almoço.

 

O Diácono retira-se novamente (esfuziante) e a acção continua.

 

Adão:

Mas... não tens vergonha de ser assim? (horrorizado)

 

Serpente Vermelha:

Cala-te com isso, e faz mas é o que te digo. Pega nela, leva-a para trás daqueles arbustos e come-a duma vez. E se estás assim com tantos problemas com isso, eu nem olho!!! Ou queres morrer?

 

Adão decide-se finalmente, e muito contra vontade e ainda indeciso, vai até junto da Eva, pega nela, hesita mais uma vez...

 

Serpente Vermelha:

Tás à espera de quê? Força! (faz um olhar bem libidinoso)

 

...e leva-a para trás dos arbustos, onde logo a seguir se vêm pedaços de roupa a voar seguidos de uns gemidos estranhos, mas que terminam logo de seguida, indo os dois de seguida embora (mas podem continuar no enquadramento, enquanto juntam uns trapitos e os vemos a ser expulsos do Paraíso). 

A Serpente fica com um olhar diabólico e solta uma sinistra gargalhada. (pode começar a cantar uma música de cariz comunista ou revolucionário).

 

O Diácono Remédios aparece novamente com o típico ar paternalista para a conclusão.

 

Diácono Remédios:

Meus amigos, vistes? A culpa foi toda dos com... dos comum... dos vermelhos.

São eles os culpados de tudo. E tudo só por 2 segundos de prazer! Tsss. Agora ide. Ide e pensai nisto. E cuidado com as.... serpentes. Elas são muito perigosas.

 

 

Conclusão provisória.
 
(Continuação na Parte III)

 

 

 

 

Parte III

 

 

 

Nota do autor relativa a Parte III: Nesta parte reside talvez o mais hilariante do guião. No entanto, quando lhe é feita uma leitura desatenta, esta Parte III aparenta uma grande complexidade, e parece impossível de realizar em televisão. Tal não é verdade, como julgo ter demonstrado no texto do guião, em que descrevo com detalhe alguns dos pormenores relativos à realização do mesmo. Tudo o que ele contêm é facilmente conseguido apenas com recurso a uma pré-produção cuidada, e sobretudo uma disciplina férrea no planeamento das filmagens das cenas, que têm de ter uma determinada sequência, que são justapostas umas sobre as outras, que depois vos posso explicitar com todo o pormenor (não são necessários mais meios tecnológicos do que os habitualmente utilizados!). Mais uma vez, só a grande capacidade e versatilidade do Herman José pode fazer funcionar o sketch, em especial a Parte III, que é talvez um dos maiores desafios que ele poderá ter como actor, mas com um resultado final altamente motivador, e completamente delirante.  

 

 

Personagens (da Parte III):

 

-        Adão (Herman José)

 

-        Prof. Herman José Saraiva (Herman José)

 

-        Diácono Remédios (Herman José)

 

-        José Esteves (Herman José)

 

-        Dr. David Vaitembora (Herman José)

 

-        Nelo (Herman José)

 

-        Zé Chunga.(Herman José)

 

-        Eva (Maria Rueff??)

 

-        Narrador/Repórter (Cândido Mota??)

 


 

(Continuação da cena anterior na Parte II)

 

 

Diácono Remédios (a cerca de 4 metros, do lado direito, imagem só capta personagem da cintura para cima), está a concluir a sua frase falado dos vermelhos, quando se coloca repentinamente em frente à camara, do lado esquerdo do enquadramento (a cerca de 1 metro) o grande comentador desportivo José Esteves.

 

Esteves:

Mas cum carago!!! Só falam de vermelho??! E antes era verde??!!!

 

O Diacono Remédios, fica estático do lado direito do ecrã, sem saber o que dizer, e sem querer acreditar no que está a acontecer. Começa balbuciando e resmungando vocábulos meio incompreensíveis, mas de modo a que o espectador se aperceba perfeitamente do que se trata.

 

Diácono Remédios:

Mas que merd... é esta? Quem foi que deixou este grande filh...

 

Esteves:

Então e o azul?! É sempre a mesma coisa! Estes murcões não se lembram do FCP nem Norte, carago! E toda a gente sabe que há serpentes azuis! Já pra não falar do Dragão, esse grande animal.

 

Em background, a cerca de 4 metros, continua o Diácono Remédios a barafustar, quando leva uma canelada  (não visível, mas o berro dele é bem audível), e cai, saindo do enquadramento. Passado 2 ou 3 segundos, reaparece muito combalido e cambaleante, o Prof. Herman José Saraiva.

 

Esteves:

Esse sim, é o rei dos animais. Não é o leão, que só ruge com a ajuda de brasileiros recém-divorciados. E agora nem isso! Eheh!! (riso típico)

 

O Prof. Herman aproxima-se, mas uma rasteira fá-lo “cair” em cima do Esteves.

 

(Este empurrão é importantíssimo, porque vai permitir uma mudança natural no enquadramento, e deste modo vai-se conseguir uma interacção quase radiofónica entre as personagens, muito do agrado de Herman José, já que de outro modo seria muito difícil ou mesmo impossível conseguir o mesmo resultado final)

 

Projectado pelo empurrão, como estava muito próximo da objectiva, Esteves encosta-se à camara. (isto permite a alteração do enquadramento, que é imprescindível para tudo o que se segue) Quando se afasta violentamente com a queda, a camara estremece um pouco e fica posicionada (sempre na mesma posição até ao final desta zona do sketch):

- a cerca de 1 metro do chão, apontando para cima cerca de 10 graus, de modo que apenas se vislumbrem ligeiramente as cabeças dos personagens (a 5 metros de distância) enquanto discutem, etc.

Começa a discussão e um princípio de pancadaria, com as três personagens a argumentar, gritar e resmungar nas suas maneiras peculiares.

Isto dura apenas 5 segundos, para de seguida toda esta acção prosseguir, mas com um volume mais baixo, assim que entra em cena a próxima personagem: o Dr. David Vaitembora, da Herman National Geografic (alter-ego de Dr. David Attenborough).

 

O Dr. David Vaitembora faz a sua entrada tradicional, empunhando e escondendo-se atrás de ramos de plantas, abanando-os freneticamente, enquanto olha para a camara, ligeiramente de cima para baixo, dada a posição da mesma. Fala em inglês, e aparecem as legendas da tradução.

 

Dr. David Vaitembora:

Here we are in Paradise, in the dawn of Mankind. In those days, men were violent, and their behavior was irracional.  In our days, something like this that we are witnessing here is of course, impossible. But in those immemorial times things were different.

 

Enquanto fala, continua a ouvir-se a pancadaria, e vê-se atrás do ombro do Dr. David Vaitembora pessoas a lutar (de costas e vestidas com as roupas das personagens, chegam mesmo a empurrar o Dr.).

 

Dr. David Vaitembora:

A mere discussion about a snake could engage furious fights that make no sense whatsoever to us. And maybe the most ridiculous of all: snakes don’t even speak. They only bite, and usually prefer to eat small animals…

 

Diácono Remédios ouve, e a custo aproxima-se da camara e diz uma só frase, sendo puxado logo de seguida novamente para a pancadaria.

 

Diácono Remédios:

Vedes?!! Vedes? Que vos digo eu?!! Os comu... comun...  Eles comem.. criancinh.... (n termina frase)

 

Diácono é puxado, e o Dr. David Vaitembora continua, cada vez com maior dificuldade com os gritos e empurrões crescentes.

 

Dr. David Vaitembora:

Of course, there are snakes for all tastes, varying from really small to giants that can measure almost 30 feet.

 

O Dr. David Vaitembora é puxado, e tenta agarrar-se às plantas, mas desliza pela folhagem abaixo. Até desaparecer completamente, só ficando visível o chapéu, que vai abanando enquanto ele luta para se libertar, indo no entanto continuar em breve a sua explicação, mas com dificuldade, agravada pela chegada à cena de mais uma personagem, que surge na imagem pela direita. Surge Nelo, na sua pose efeminada, e como sempre ansioso por roubar o protagonismo alheio.

 

Nelo:

Ai, mulhere, eu cá não gosto de cobras. Aquelas grandes e grossas.. até me arrepia só de pensar nisso!! A entrarem em buracos escuros... (pequena pausa enquanto imagina, sorrindo disfarçadamente) E as gibáias?! Essas é que são!! Enrolam-se-nos e não nos podemos mexer. E comem-nos assim mesmo, com roupa e tudo. Engolem tudinho. (vai fazendo os gestos habituais nele)

 

O Dr. David Vaitembora consegue por momentos levantar-se um pouco (não totalmente), e continua a explicação.

 

Dr. David Vaitembora:

Also the colour can vary a lot. They have a whole range of colours, from red to green, and from white to completely black. This also depends of the weather and region of the globe they live in, like South America or Africa.

 

O Dr. David Vaitembora apanha nova cacetada e desliza mais uma vez pela planta até desaparecer completamente, depois de muito abanar a folhagem. Logo aproveita o Nelo para de imediato se introduzir novamente na conversa.

 

Nelo:

Em Africa é que é!! Eu não sei, mas já me contaram que há lá cada bicha.. uma maior que outra!! Adeve de ser do calor! Com a tempuratura e a midade, aquilo adeve de crescer!! (pequena pausa) Mas não é só lá! Eu, euzinha já passei ali por Monsanto, e já vi por lá bichas bem escuras. A maior parte eram brancas, mas estes olhos que a terra háde comer, viram muito bem! E aquerse dizer, até foi mais sentir, elas tinham assim umas mãos grandes e fortes... (mais uma pequena pausa imaginando e sorrindo enquanto passa as mãos pelo corpo dele).

 

Mais uma vez, o Dr. David Vaitembora ergue-se um pouco.

 

Dr. David Vaitembora:

Hands?! What the hell are you talking about??!! Snakes don’t have hands!!

 

Nelo comprometido, tenta desconversar e desvia o olhar para o grupo ainda à pancada (sempre fora da imagem).

 

Nelo:

Olha aquele senhor! Tadito! Acho que tá a nessitar dajuda. Coitado, tá de gatas e não se consegue alevantar!

 

Nelo, vendo “oportunidade”, dirige-se lá (aproveitando para sair do buraco onde se tinha metido), e ouve-se seguidamente o que ele vai fazer.

 

Diácono Remédios:

Muito obrigado pela ajuda. Finalmente um bom samaritano! Estes filh... da put.. de merd.. não são bons católicos. Não têm educação nenhuma!! (pequena pausa) Mas... que é que está fazer?... Que têm as minhas calças?!... EH LÁ!......

 

Surge finalmente a última personagem, numa aparição fugaz. Entra numa desportiva no enquadramento o drogado e arrumador de carros Zé Chunga (pelo lado esquerdo), com o estilo habitual, fungando abundantemente, mas não olhando para a camara. Ele não está interessado na camara, e toda a atenção dele dirige-se para o grupo, que fica a observar.

 

Zé Chunga:

Mas o que é que se passa aqui?! Já nem se pode gamar umas coisas em paz? (fica surpreendido com o que se passa) Ahh?!! Atão há pancada, e ninguém me tinha dito nada, pá? (pausa) Dá-lhe!! Olha, olha! Pela esquerda! Na cara, pá! (pausa) Mas que é que aqueles dois tão a fazer?! Ahh!! Eheheh!!!! Toma!!!

 

Surge mais uma vez, o incansável Dr. David Vaitembora (do lado esquerdo), agarrando-se às suas inseparáveis plantas. Recomeça a sua explicação enquanto Zé Chunga vai gritando bocas e impropérios variados, mas continuando no lado direito da imagem, servindo de tema ao botânico.

 

Dr. David Vaitembora:

This, my friends, is a very special specimen. In the modern age, it’s a species that lives all over the world, feeding itself mostly of music. (pequena pausa) More exactly car radios. We can easily spot them in the middle of a crowd, just by using our nose.

 

O Dr. David Vaitembora faz cara de quem acabou de se aperceber do aromático "perfume" corporal de Zé Chunga.

Entretanto Zé Chunga, depois de muitos gestos e provocações (sempre acompanhados de muitas comichões em várias partes do corpo, que ele coça despreocupadamente), decide-se e desaparece da imagem em direcção ao grupo, ouvindo-se o mesmo a distribuir (e receber) murros e pontapés.

 

Dr. David Vaitembora:

It can become quite unstable and dangerous, and sometimes when teased he could be very violent.

 

Pancadaria espalha-se e Dr. David Vaitembora é atingido por alguém de costas, talvez Zé Chunga (obviamente alguém vestido com as roupas dele). Desaparecem os dois da imagem e só fica no enquadramento a parte superior das plantas, que passado uns segundos terminam de abanar, continuando no entanto o som da pancadaria no ar, que parece prolongar-se por muito tempo, com todas as personagens a trocarem galhardetes (e não só!).

 

Lento Fade-out.

 

Conclusão provisória.

 
(Continuação na Parte IV)

 

 

 

 

Parte IV

 

 

 

Fade-in.

 

Vemos Adão e Eva com umas trouxas às costas, afastando-se do local onde estava a macieira (que fica na direcção oposta).

Eva fala (quase grita) com Adão, que vai calado e cabisbaixo. A caminhada é interrompida por um narrador/repórter (que não é visível na imagem).

 

Narrador/Repórter:

Desculpem, posso interrompê-los?

 

Adão e Eva páram, e voltam-se para a camara. Eva não está muito satisfeita.

 

Narrador/Repórter:

Têm algum comentário a fazer? Senhora Dona Eva, parece que isto não vos correu muito bem Não parece muito satisfeita...

 

Eva:   (com voz irritada e agastada, mascando uma pastilha elástica)

Pois não, pá! Aqui este imprestável não durou nem dois  minutos. Assim uma mulher não se orienta, pá!

 

Narrador/Repórter:

Ah? Mas...Mas... Não, o que eu queria dizer era: como se sentem por ter sido expulsos do Paraíso?

 

Eva:

Expulsos?! Mas ninguém foi expulso de lado nenhum!

 

Narrador/Repórter:

Não?! Mas então,... está escrito!!...

 

Eva:

Escrito? O que é isso?!! (continua sempre com a pastilha)

 

Narrador/Repórter:

Bem, a escrita é... não interessa. Mas então porque é que se vão embora do Paraíso?

 

Eva:

Estás a brincar, pá?! Não tens ouvidos? Quem é que pode viver aqui com este basqueiro (ou chinfrineira)??!!!

 

Narrador/Repórter:

Ah, bom! É que pensei que se tinham ido embora porque Deus os tinha expulso.

 

Eva:

Tínhamos ido embora???!! ESTAMOS a ir!! Oh pá, eu até posso não saber o que é isso da escrita, mas ao menos sei conjugar os tempos verbais!!! (olha para o repórter com olhar de desdém)   Mas ninguém nos mandou embora, pá! (aproxima-se mais da camara, e diz em voz mais baixa) E aqui entre nós, quero ver se fora daqui arranjo alguém melhor que este inútil!!!

 

Vira-se para Adão.

 

Eva:

Olha bem pra isto, pá! (aponta para Adão) Não tens vergonha? Não serves pra nada!!

 

Narrador/Repórter:

Mas.. Se não se importa...

 

Sem deixar o repórter dizer mais nada, vira-se, dá um pontapé no Adão e continuam o seu caminho.

 

Eva:

Vamos embora, ó estúpido. Estás à espera de quê?! Bora!!

 

Adão vai na frente, tentando abstrair-se das palavras (e insultos) da Eva.

Afastam-se, sempre com Eva criticando e falando incessantemente.

 

Imagem mantém-se neles durante mais uns segundos, enquanto se afastam, e o som de Eva a gritar também diminui.

 

 

Fade out

 


 

 

Ecrã negro.

Surge o Prof. Herman José Saraiva, cambaleando, com um olho pisado e roupa algo rasgada, e com camisola torta. A voz não é tão decidida como habitualmente, pois está cansado, e vai olhando disfarçadamente para o lado, para ver se aparece alguém, para mais “interrupções”.

 

Prof. Herman:

Meus amigos... (engole em seco) ... a vida de estoriador é mais movimentada do que os senhores telespectadores imaginam. E bem mais do que eu gostaria.

 

Quando o Prof. tenta levantar os braços no seu gesto característico, solta um pequeno esgar de dor.

 

Prof. Herman:

...e até doloroso! Mas voltemos à nossa estória... antes que apareça por aqui mais algum louco deturpador da verdade.

 

Esta última frase é proferida de forma mais rápida e com um volume sonoro inferior.

Olha desconfiadamente e de forma rápida em sua volta.

 

Prof. Herman:

Pois como vimos... Adão e Eva afinal não foram expulsos do Paraíso, tiveram foi que vir embora porque realmente o ambiente por lá não era dos melhores. Posso assegurar-vos que era quase tão mau como o Bairro Alto ou a Avenida 24 de Julho ao fim de semana à noite, mas sem a música.

 

Prof. Herman:

Ora bem, gostava de vos poder dizer que depois disto, viveram felizes para sempre, mas realmente não foi bem assim. Vamos ver.

 

Prof. Herman passa a narrar em voz off, ou em alternativa faz a introdução descrevendo a situação, e depois retira-se suavemente para se assistir à continuação do desenrolar da história, enquanto ele faz a narração.  Por detrás dele vê-se uma outra floresta. A imagem deve abarcar o maior largura possível (talvez 10 metros, para a cena seguinte resultar em pleno).

 

(Nesta seguinte sucessão rápida de cenas que se seguem, que dura cerca de um a dois minutos, as personagens vão dizendo pequeníssimas frases e sons de chamamento que se coadunam com as situações, que aqui no entanto omito, de modo a não me prolongar na explicação)

(as movimentações dos personagens estão graficamente representadas a vermelho)

 


 

Prof. Herman:

Infelizmente o defeito de fabrico da Eva, ainda se tornou pior quando saíram do Paraíso.

»»»»»» 

Vemos Eva  a correr 2 metros atrás de Adão, que cobre desesperadamente os ouvidos com as mãos, tentando evitar a tortura sonora.

Atravessam o ecrã da esquerda para a direita, desaparecendo do enquadramento.

 


 

Prof. Herman:

Por seu lado, Adão tinha pouco com que se entreter. Ainda não tinha sido inventada a televisão!

««««««

Vemos Adão a correr 2 metros atrás de Eva, que tenta cobrir o corpo, enquanto ele a persegue com olhar libidinoso.

Atravessam o ecrã da direita para a esquerda, desaparecendo do enquadramento.

 


 

Prof. Herman:

E assim nasceu o primeiro filho de Adão e Eva. Era Abel... que infelizmente herdou os dotes vocais da mãe.

»»»»»»

Vemos Eva, agora com o filho nos braços, a correr 2 metros atrás de Adão, que cobre desesperadamente os ouvidos, tentando não ouvir Eva a falar, e o filho a berrar.

Atravessam o ecrã da esquerda para a direita, desaparecendo do enquadramento.

 


 

Prof. Herman:

Adão no entanto tinha a memória curta. E claro, continuávamos sem inventar a televisão.

««««««

Vemos novamente Adão a correr 2 metros atrás de Eva, que tenta cobrir o corpo, enquanto ele mais uma vez a persegue com olhar libidinoso.

Atravessam o ecrã da direita para a esquerda, desaparecendo do enquadramento.

 


 

Prof. Herman:

E então nasceu Caim.

»»»»»»

Vemos Eva, agora com um filho nos braços, outro pela mão (ou em alternativa, um em cada braço), a correr 2 metros atrás de Adão, que cobre (outra vez!) desesperadamente os ouvidos, tentando não ouvir Eva a falar, e os dois filhos a berrar.

Atravessam o ecrã da esquerda para a direita, desaparecendo do enquadramento.

 


 

Prof. Herman:

Com tudo isto, Adão resolveu ir comprar cigarros ao quiosque da esquina.

[][][][][][]

Eva surge com os dois filhos, e senta-se no meio do enquadramento.

 

Prof. Herman:

Acontece que naqueles tempos não havia quiosques, nem sequer cigarros...

[][][][][][]

Eva continua sentada à espera.

 

Prof. Herman:

...Adão fartou-se de procurar, mas perdeu-se no caminho e nunca mais apareceu.

[][][][][][]

Eva ainda sentada, cada vez mais triste.

 

Prof. Herman:

Foi este o começo do célebre esquema, mais tarde muito utilizado: ir comprar cigarros, e depois nunca mais aparecer!!!

 

Eva levanta-se, pega nos filhos, e afasta-se do centro do enquadramento.

 


 

 

Fade-out.

 

 

Conclusão provisória.

 
(Continuação na Parte V)

 

 

 

Parte V

 

 

 

Personagens (da Parte V):

 

-           Adão (Herman José)

 

-           Eva (Maria Rueff)

 

-           Abel (Herman José)

 

-           Caim (Joaquim Monchique)

 


 

Fade-in.

 

 

Prof. Herman José Saraiva continua a sua narração.

 

Prof. Herman:

E assim cresceu esta primeira família. Adão apareceu passado muito tempo, depois da sua longa, mas infrutífera busca por um maço de cigarros, proporcionando um felicíssimo reencontro.

 

Vemos o reencontro de Adão e Eva.

Na imagem, Adão chega de frente para a camara, Eva corre para ele muito feliz (talvez com os filhos ao colo). Eva abraça-se a Adão e filhos (agora já com alguns anos de idade) agarram-se às duas pernas dele. A camara faz um zoom até à cara de Adão, que mostra uma cara muito entediada, e de completo aborrecimento por ter de os voltar a aturar novamente.  

A esta cena o Prof. Herman faz um comentário muito(?) adequado.

 

Prof. Herman:

È o amor paternal na mais pura das manifestações, meus amigos.

 


 

Muda o enquadramento.

Vemos novamente a floresta (plano com cerca de 5 a 6 metros de largura).

 

(Nesta outra sucessão rápida de cenas que se seguem, que dura também cerca de dois minutos, as personagens vão dizendo pequeníssimas frases e sons de chamamento que se coadunam com as situações, que aqui mais uma vez omito, de modo a não me prolongar na explicação)

(as movimentações dos personagens estão graficamente representadas a vermelho)

 


 

Prof. Herman:

E viveram muitos anos de felicidade. O pai dava-se bem com a mãe...

»»»»»» 

Vemos Adão a correr e a bater (dando murros e pontapés) na Eva.

Passa na imagem da esquerda para a direita.

 


 

Prof. Herman:

...dava-se bem com os filhos...

»»»»»» 

Vemos Adão a bater (dando murros e pontapés) nos filhos.

(nesta imagem, uma vez que Adão e Abel são representados pelo mesmo actor, no enquadramento vemos os dois filhos a “correr” abaixados, simulando a sua fase infantil, com recurso a uma adaptação de Abel à conhecida personagem Nelito. Do pai deles, Adão, apenas vemos o corpo do pescoço para baixo)

Adão corre atrás deles vociferando.

 


 

Prof. Herman:

...dava-se bem com todas as criaturas ...

»»»»»» 

Vemos Adão a correr atrás de uma ovelha ou cabra (apenas se vê na imagem a parte de cima do animal).

Passa na imagem da esquerda para a direita.

 


 

Prof. Herman:

...e Abel também se dava bem com Caim...

»»»»»» 

Vemos o filho, Abel, a correr e a bater (dando murros e pontapés) em Caim.

Passa na imagem da esquerda para a direita.

 

Caim:

Caim,... caim,... caim... (diz ganindo baixinho)

 


 

Prof. Herman:

...e graças à sua herança genética, também se dava bem com todas as outras criaturas de Deus.

»»»»»» 

Vemos Abel a correr atrás de uma ovelha ou cabra (apenas se vê na imagem a parte de cima do animal).

Passa na imagem da esquerda para a direita.

 


 

 

Prof. Herman:

E os anos passaram a correr, ou pelo menos com eles a correrem uns atrás dos outros.

 

Reaparece o Prof. Herman José Saraiva na imagem.

 

Prof. Herman:

Ora  meus amigos, acontece que este é justamente um dos pontos mais obscuros e desconhecidos desta nossa estória.

Foi exactamente aqui, que La Fontaine se inspirou para criar a sua famosa fábula da Formiga e da Cigarra

 

O Prof. Herman retira-se do enquadramento, para dar lugar à próxima cena.

 

Prof. Herman:

Caim cresceu e fez-se lavrador, trabalhando arduamente a terra, labutando de sol a sol, de forma incansável.

 

Imagem mostrando Caim cavando o campo, suando abundantemente, com um aspecto humilde.

 

Prof. Herman:

...enquanto que Abel se tornou pastor, como aliás poderia indicar o seu precoce interesse pelos animais. Vivia uma alegre e calma vida, apascentando suas queridas cabrinhas, e ocupando todo o seu tempo cantando despreocupadamente, sem pensar no dia de amanhâ,...

 

Imagem mostra Abel, com um cajado na mão, mas com um aspecto quase boémio, cantando muito desafinadamente (talvez um pequeno excerto de um fado).

 

Prof. Herman:

Ora acontece que Abel, que entretanto melhorara os seus já muito desenvolvidos dotes vocais, estava cheio de razão, porque embora sem o saber, não viveria para ver esse amanhã!

 

Vemos em background Caim a entrar em desespero, depois de tantas cantorias do irmão.

 

Prof. Herman:

Terminaria de forma trágica e prematura, aquela que poderia ser uma grande carreira musical. Ficaria conhecido para a posteridade, em homenagem ao seu rebanho como: “Abel Cabra”.

 

Vê-se e ouve-se Abel (Herman, com o seu jeito para esta música em especial), cantando a plenos pulmões o refrão duma famosa música:

 

Abel Cabra:

“São lágrimas. São lágrimas. São lágrimas escorrendo do meu rosto.”

 

Caim aproxima-se sorrateiramente, com os olhos denotando um estado de loucura avançada.

 

Prof. Herman:

Senhores telespectadores,... foram realmente lágrimas. O seu irmão Caim não conseguiu suportar esta terrível tortura, e num gesto de humanidade perfeitamente compreensível, acabou com este tormento.

 

Vemos Caim surgir por detrás de Abel, e com um certeiro golpe acerta-lhe na cabeça (com uma moca tipo Homem das Cavernas)

Abel cai e sai do enquadramento. Continua por momentos a cantar, transformando-se rapidamente em gritos, até se calar definitivamente. Caim, mesmo com Abel fora do enquadramento, continua a bater-lhe (na direcção do chão) até ele se calar, e durante mais alguns segundos depois disso.

 

Abel Cabra:

“São lágrimas. AI!!.. São lágrimas. AAIIII!!... São lágrimas escorrendo do meu rosto.” ......

 

Prof. Herman:

. mas quem o pode censurar?! Não é possível alguém aguentar aquela voz por muito tempo. E ainda bem que o fez, meus amigos, porque senão quem sabe até onde chegaria Abel Cabra? A gravar discos? Ou quem sabe, até a aparecer em programas de televisão? Dúvidas que felizmente nunca veremos respondidas.

 

Caim pára, depois de muito bater em Abel, começando a aperceber-se do que acabou de fazer. Baixa a moca, e depois leva as mãos à cabeça, no entanto mantendo a moca numa das mãos.

Caim (Joaquim Monchique) faz a sua imitação de Manuel Subtil fechado na casa de banho da RTP, gritando desesperado.

 

Caim:

Ai Jesus!! Ai Jesus!! Ai meu Deus!!! Ai Jesus!!!!...

 

Prof. Herman:

Mas agora já era tarde, o mal já estava feito, meus amigos.

 

Caim continua a sua gritaria, mas vai-se afastando até desaparecer do lado direito da imagem.

O Prof. Herman José Saraiva volta a aparecer no enquadramento.

 

Prof. Herman:

Caim ainda tentou refugar-se numa casa de banho de alguma estação pública de televisão, mas nesta altura continuávamos ainda sem inventar a maldita da televisão!! Por isso, teve que se ir embora, plantar batatas para outro lado. A culpa de todos os males do mundo é pois da televisão! Ou melhor de não haver televisão...

 

Começamos a ouvir Caim a aproximar-se, continuando com a gritaria.

O Prof Herman vai olhando de soslaio para a direita da imagem, mas continua a explicação, ainda que hesitante.

 

...E foi assim. Caim foi enlouquecido pela voz do irmão Abel,... e tornou-se o primeiro homicida da História. Na verdade...

 

Caim reaparece no lado direito da imagem, de moca em punho, por detrás do Prof. Herman. Olha-o de maneira a que o espectador antecipe o que vai acontecer.

 

...só não se tornou um serial killer porque por esta altura já Adão e Eva tinham fugido para bem longe. Foram comprar cigarros!! Claro que se alguém estivesse por perto, teria o mesmo destino...

 

O Prof. Herman não termina a frase, porque Caim dá-lhe uma grande mocada. No entanto não é visível o momento do impacto. Aparece um ecrã negro, onde se lê:

 

CENSURADO

 

Ouvem-se as pancadas da moca, juntamente com os gritos do Prof. Herman. Aparece o ecrã:

 

ESTORIADOR EM SOFRIMENTO

 

E ouvem-se as vozes das duas personagens:

 

Prof. Herman:

Ai meu Deus! AI!! Ai Jesus!! AI!!!...

 

Caim:

Ai Jesus!! Ai Jesus!! Ai meu Deus!!! Ai Jesus!!!!...

 

 

Fade-out.

 

 

Conclusão provisória.

 
(Continuação na Parte VI)

 

 

 

Parte VI

 

 

 

Personagens (da Parte VI):

 

-           Abel (Herman José)

 

-           Caim (Joaquim Monchique)

 

-           Diácono Remédios (Herman José)

 

-           Esteves (Herman José)

 

-           Serpente Vermelha (Ana Bola)

 


 

Fade-in.

 

 

Reaparece do lado direito do enquadramento, com a face muito próxima da camara, afastando-se depois progressivamente, o Diácono Remédios.

 

Diácono Remédios:

Meus amigos... tsss... Meus amigos... Não havia necessidade.

 

Enquanto o Diácono se afasta, reparamos que ele tenta apressadamente ajeitar a roupa, sobretudo as calças, que traz todas desabotoadas, por razões “desconhecidas”.

 

Diácono Remédios:

Não devemos invocar o nome do Senhor sem necessidade! (refere-se aos gritos do Prof. Herman, que grita pela ajuda de Deus)  Ai meu Deus! Meu Deus! (invoca o Diácono, suspirando, aparentemente com razão)

 

Por fim, cessamos de ouvir as outras duas personagens.

 

Diácono Remédios:

Vedes!? Vedes!? É o que acontece a quem não fala a verdade! Claro que todos sabem que as coisas não se passaram assim. Não foi por causa de cantorias que Caim matou Abel. Não,... mas tende atenção, não pequeis, porque senão ides para o Inferno, e tendes de ouvir aquela música para toda a eternidade!! Eh... mm... (riso contido característico)

 

O Diácono recupera a compostura, e reaparece a floresta em background. Retornamos atrás no tempo e o Diácono apresenta pela segunda vez a sua verdade, saindo de imagem (vemos a floresta com um plano com cerca de 5 a 6 metros de largura).

 

Aqui é fulcral o paralelismo com a cena inicial do sketch, com as histórias das serpentes. Vital que o espectador se aperceba da repetição do esquema, para dar maior impacto.

 

(Nesta outra sucessão rápida de cenas que se seguem, que dura cerca de um minuto, as personagens vão dizendo pequeníssimas frases e sons de chamamento que se coadunam com as situações, que aqui mais uma vez omito, de modo a não me prolongar na explicação)

(as movimentações dos personagens estão graficamente representadas a vermelho)

 


 

Diácono Remédios:

Esta nossa primeira família viveu muitos anos de felicidade. O pai dava-se bem com a mãe...

»»»»»» 

Vemos Adão a correr e a bater (dando murros e pontapés) na Eva.

Passa na imagem da esquerda para a direita.

 


 

 

...dava-se bem com os filhos...

»»»»»» 

Vemos Adão a bater (dando murros e pontapés) nos filhos.

(nesta imagem, uma vez que Adão e Abel são representados pelo mesmo actor, no enquadramento vemos os dois filhos a “correr” abaixados, simulando a sua fase infantil, com recurso a uma adaptação de Abel à conhecida personagem Nelito. Do pai deles, Adão, apenas vemos o corpo do pescoço para baixo)

Adão corre atrás deles vociferando.

 


 

 

...dava-se bem com todas as criaturas ...

»»»»»» 

Vemos Adão a correr atrás de uma ovelha ou cabra (apenas se vê na imagem a parte de cima do animal).

Passa na imagem da esquerda para a direita.

 


 

 

...e Abel também se dava bem com Caim...

»»»»»» 

Vemos o filho, Abel, a correr e a bater (dando murros e pontapés) em Caim.

Passa na imagem da esquerda para a direita.

 

Caim:

Caim,... caim,... caim... (diz ganindo baixinho)

 


 

 

...e com todas as outras criaturas de Deus.

»»»»»» 

Vemos Abel a correr atrás de uma ovelha ou cabra (apenas se vê na imagem a parte de cima do animal).

Passa na imagem da esquerda para a direita.

 


 

Reaparece o  Diácono muito aflito e surpreendido na imagem, quando vemos em background Abel a tentar agarrar uma ovelha. Aproxima-se da camara e tenta com o corpo tapar a cena que se passa atrás dele, abafando também o som.

 

Diácono Remédios:

Mas... Mas... Isto não foi assim... Meus amigos... Mas que pouca vergonha!...

 

Olha para trás para se certificar que já não está lá ninguém, e continua a explicação.

 

Diácono Remédios:

Mas voltando à nossa história, os anos passaram a correr.

 

O Diácono volta a retirar-se de cena, ainda que a medo, e não totalmente recomposto do que lhe acabou de acontecer.

 

Diácono Remédios:

Caim cresceu e fez-se lavrador, trabalhando arduamente a terra, labutando de sol a sol, de forma incansável.

 

Imagem mostrando Caim cavando o campo, suando abundantemente, com um aspecto humilde.

 

Diácono Remédios:

...enquanto que Abel se tornou pastor. Vivia uma alegre e calma vida, apascentando suas queridas cabrinhas, e ocupando todo o seu tempo cantando despreocupadamente, sem pensar no dia de amanhâ,...

 

Imagem mostra Abel, com um cajado na mão, mas com um aspecto quase boémio, cantando muito desafinadamente (talvez um pequeno excerto de um fado).

 

Diácono Remédios:

Ora acontece que Abel, que inocentemente se dedicava ao seu rebanho... não podia imaginar que não viveria para ver esse amanhã! Caim acabaria por o matar, mas foi por causa das más companhias... Sim, porque a verdade é que a maldita Serpente Vermelha andava por ali a rondar. Os com... os comum... os vermelhos andam sempre a espalhar o veneno.

 

Vemos Caim a cavar, com aspecto esforçado e cansado, enquanto que em segundo plano vê-se Abel a brincar, andando de um lado para o outro, trauteando e assobiando.

Surge ao lado de Caim, a Serpente Vermelha, de olhar maléfico, que entabula conversa com ele.

Caim, tem a personalidade e modos de falar de um matarruano.

Serpente Vermelha:

Olá!

 

Caim:

Olá, animal desconhecido! Quem és tu?

 

Serpente Vermelha:

Não me conheces? Ah!... Ainda bem!

 

Caim:

Ainda bem? Mas...

 

Serpente Vermelha:

Não, o que eu queria dizer era... sou tua amiga! Podes confiar em mim!

 

Ouvimos agora em off, uma troca de palavras entre duas personagens.

 

Esteves:

Olha, olha! Confiar! Nunca se debe confiar em alguém de vermelho. Só nos de azul, e nos de preto, quando estão comprados!

 

Diácono Remédios:

Mas... Outra vez?! Uma alma cristã já não pode conter uma m... duma história sem ser interrompido por algum fil.. d. p...?!!

 

Esteves:

Oh.. Cum carago...

 

Ouve-se Diácono a bater no Esteves e expulsá-lo dali.

Entretanto a Serpente Vermelha e Caim pararam a conversa, e estão a olhar para a camara fixamente, aguardando que aquela conversa paralela termine.

 

Caim:

Atão? È pra oije??!! Um homem assim não se orienta!! Já nem se pode trabalhar em paz, ou quê?!

 

Caim de seguida, readquire a sua postura humilde e sofrida, retomando o trabalho. A Serpente Vermelha posiciona-se como o típico sindicalista, tentando recrutar novos membros.

 

Serpente Vermelha:

Pois é! Já ninguém respeita os trabalhadores. Olha bem pra ti!!

 

Caim:

Para mim?! O que tenho?!

 

Serpente Vermelha:

Ora exactamente! Não tens nada!!

 

Caim:

Mas o que raio é que eu havia de ter?! Nesta época não há nada!

 

Serpente Vermelha:

Pois não, mas vai haver! Já viste que estás aqui a ser explorado? Tu és a classe trabalhadora! E estás a ser explorado pela burguesia!

 

Caim:

Burguesia?! O que é isso!?

 

Serpente Vermelha:

Olha, tu trabalhas, e não ganhas nada! O teu irmão não faz nada, passa o dia a apanhar banhos de sol e a cantar de galo!

 

Caim:

A cantar de galo? Isso eu não sabia! Pensava que só fazia de vez em quando uma cantada a uma ovelhita...

 

Serpente Vermelha:

Ah!... Arre que és mesmo burro! Eu explico-te...

 

Inverte-se o enquadramento. Vemos em primeiro plano Abel, deitado ao sol, de óculos escuros, a trautear (ou a assobiar) uma música, e em segundo plano, Caim com a Serpente Vermelha a “evangelizá-lo” com a teoria comunista.

Assiste-se ao longe a Caim a ficar cada vez mais revoltado, vai buscar uma moca, e dirigindo-se a Abel surpreendendo-o de costas e proferindo apenas no último momento, e antes da mocada, umas poucas palavras.

 

Caim:

Burguês!! Explorador!! Desgraçado!!

 

Fade-out.

 

Ecrã negro.

Reaparece o Diácono Remédios, desta vez realmente para a conclusão.

 

Diácono Remédios:

E esta, meus amigos, tss... è a verdadeira história de Adão e Eva, de Abel e Caim, e em como a culpa de tudo o que de mal existe no mundo, é culpa dos com... comun... istas, cof, cof,... dos malvados vermelhos.

Ide. Ide, e meditai sobre isto. ou quereis ir para o Inferno ouvir aquela música para todo o sempre?!!

 

Fade-out.

 

Genérico final.

 

 

FIM

(ou talvez não)